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terça-feira, 24 de maio de 2011

Imagens do tempo

Remexi minhas gavetas e revivi lembranças. Fotos antigas, amareladas pelo tempo. Algumas me arrancaram sorrisos e histórias, outras, lágrimas e mais histórias. Tenho um pouquinho de cada uma delas na essência que me constrói, ou destrói, talvez.
O meu medo de escuro, veio de uma imagem bonita, de infância. A menininha de cabelos desgrenhados, sozinha no sofá da sala de vó. Boca grande e lágrimas nos olhos. Tinham tirado de mim a companhia mais prazerosa dos momentos de choro. A sala sem muitos móveis, apenas aquele sofá verde, a televisão e um enorme espaço que me proporcionou quedas e brincadeiras surreais.
Da outra lembrei da sede por liberdade. A primeira queda de bicicleta. O vento bate no rosto e o sorriso transparece involuntariamente. Caí feito fruta madura no pé, ganhei um galo na testa e minha primeira conquista: Aprender a andar de bicicleta sozinha.
Ai veio a mangueira. Onde aprendi a subir em árvores. Foi ali que vi a única coruja da minha vida, da janela, com olhos pretos e penetrantes, brilhava tanto que hipnotizava. Descascava a fruta ainda verde com a boca e comia com sal. Sempre ouvia que ia morrer, mas ainda continuo aqui. Bom, hoje, ela já não existe mais, tem cimento e pedras cobrindo o túmulo da minha infância bonita e cheia de histórias. Aquela era a minha alegria: trepar na árvore, brincar descalça na terra, colher café para a tarde e comer alguns grãos, correr atrás das galinhas quando soltas e inventar coisas no balanço feito pelo meu avô.
Mais tarde, notei que a criança tinha crescido. A foto ao lado do primeiro amor. Aii, quanta lembrança. Achei, junto a foto, o bilhetinho que escrevi e nunca entrei. O menino parecia um ratinho, mas fazer o que (?!) foi ele que me fez derramar a primeira lágrima de amores platônicos. Primeiros anos de escola e como ele poderia olhar pra mim, eu joga bola com ele no pátio. Pudera! Primeira desilusão.
Tem um álbum, em especial, que choro sempre que vejo. Onde estão as pessoas que me iniciaram no meu mundo de hoje: a arte. Palhaços, pirotecnia, música, performances. Ali tinha de tudo. Uma casa pequena, mas que abrigava alguns personagens brilhantes e tinha nos quatro cantos espalhados a arte. Foi onde traduzi a vida em melodia pela primeira vez, tinha meus 11 ou talvez 12 anos. Pronto! A partir daquele momento eu não tirei de mim a sensação mais gostosa, era uma liberdade e um brilho intenso nos olhos. Que carrego até hoje quando subo no palco.
São tantas histórias, tantas fotos, tantas lembranças, tanto de mim. Sou isso tudo. O medo de ir sozinha, a liberdade do vento, o contato com a natureza, a paixão pela arte, um tanto de desilusão e muito de amor. Nesse meio tempo me deparei com outras coisas que fazem de mim o que sou. Pessoas, lugares, espaços e desencontros. Os perdidos são maiores, mas encontrei flores que trago comigo. Da intensidade silenciosa, do amor inteiro, da música, dos palcos, da vida, da liberdade. De um todo (ou tudo) que sinto falta e de um todo (ou tudo) que tenho.
Sou imensidão vasta presa dentro do peito. Imaginação inebriante. Sou amigos, sou amor, sou familia, sou arte, sou gosto, sou desejo e disso tudo quero apenas completar: sou um todo de uma parte que já me tinha.

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